A cada dia aumenta mais a expectativa em torno da prorrogação da CPMF. O debate é feroz: de um lado estão opositores à prorrogação, sempre sustentando sua posição na necessária redução da carga tributária, que no Brasil é escorchante, e apontando as inconstitucionalidades deste tributo, especialmente pelo fato de ser uma "contribuição provisória-permanente"; do outro lado, defende-se a contribuição em razão da dependência que o Governo tem de sua elevada arrecadação, que em 2008 atingirá R$ 39 bilhões. Pouco se fala da importância da saúde.
De outra parte, há algum tempo já divulgamos nossa opinião de que a prorrogação é inevitável, principalmente em razão do montante arrecadado. Da mesma forma, toda articulação política armada no Congresso Nacional dá conta de que será inócuo qualquer movimento contra a revitalização da CPMF. Contudo, entendemos que tais movimentos são de suma importância em um país que se pretende democrático.
O que mais impressiona no panorama nacional são as justificativas dos defensores da prorrogação da CPMF.
Recentemente o Ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, nos "brindou" com a seguinte
declaração:
"Não podemos generalizar, mas não tem dúvida de que por trás do clamor que a sociedade faz para que se baixe a carga tributária, é evidente que tem o movimento político para desestabilizar as contas do governo e conseqüentemente tentar prejudicar o Lula ou coisa parecida. E não tem dúvida de que tem também a parcela daqueles que sonegam e que vêem a CPMF com ódio porque é uma espécie de dedo-duro da sonegação."
No mesmo sentido são as manifestações do Presidente Lula, que em outras oportunidades já referiu que a CPMF é um tributo justo, pois combate a sonegação fiscal.
Daí cabe a pergunta: é função dos tributos, seja de qual espécie for (imposto, taxa, contribuição de melhoria, contribuição especial ou empréstimo compulsório), combater a sonegação fiscal?
Ora, até o incipiente nas lides do Direito sabe que os tributos têm a finalidade de "obter os recursos necessários para o regular funcionamento do Estado" (DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 17), ou, como bem pontifica Hugo de Brito Machado, a tributação possibilita ao Estado "realizar os seus fins sociais" (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1992). Cumpre referir que há tributos com caráter extrafiscal, cuja principal função não é arrecadar fundos para o Estado, mas estimular ou desestimular certas atividades. Entretanto, genericamente e historicamente podemos afirmar que a função primordial dos tributos é possibilitar fundos para que o Estado realize a sua função.
Defender a instituição de um tributo com função de combater a sonegação fiscal é uma heresia do ponto de vista científico e constitucional, além de ser um argumento apelativo que tenta minimizar o impacto negativo que a prorrogação da CPMF provocará na opinião pública. Tal constatação apenas demonstra o despraparo de nossos atuais governantes.
Como se isso não bastasse, o combate à sonegação fiscal cabe à própria administração, em especial a Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRF), que goza de recursos e pessoal capacitado o suficiente para a realização desta atividade. Neste ritmo, a SRF não necessitará mais de fiscais ou auditores, uma vez que já está o contribuinte, por meio de uma infindável série de obrigações acessórias (apresentação de declarações, escrituração, emissão de guias, apuração do tributo, recolhimento...), realizando grande parte do trabalho destes. Parece que agora, com a nova espécie tributária encarregada de combater a sonegação, poderá a SRF finalmente parar suas atividades e descansar!
Ironias à parte, preocupa cada vez mais a forma pela qual o administrador vem pautando a sua relação com o contribuinte, presumindo desde logo a sonegação. Certamente se buscasse o diálogo os resultados seriam bem melhores que os atualmente obtidos.
Sem dúvida, a justificação da imprescindibilidade da prorrogação da CPMF deve estar na importância da saúde pública. Contudo, esta realmente não é uma preocupação, pois consabido é que os recursos desta contribuição à saúde não se destinam.